sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O Regresso de Algo Que Nunca Partiu



Passei algumas semanas a viver um jogo de faz de conta. A paisagem era esplêndida. Nada me atormentava o coração com mágoas e sonhos que sabia que nunca se iriam cumprir. Anulava todos os pensamentos melancólicos da minha cabeça com medo de cair no que julgava ser o principal tormento. Enganei-me a mim própria todo este tempo, enganando todos os que me rodeavam. Julgava ser a pessoa mais fria que conhecia. Mas eu não me conheço. Não sei quem sou. Mas sei que fria nunca poderia ser.
Na minha cara, projecta-se a vergonha de não ser alguém melhor. As rosas que floriram na minha face jamais murcharão enquanto eu não estiver a certeza da loucura em que me meti. Ou que me meteram.
Sentir tudo novamente. Ou melhor, saber o que sentir.
Quando eu pensava que nada amava e que objectivo não tinha, nasce um vazio que já me era algo familiar. Faltava-me alguém.
Olhei em meu redor e procurei em cada mente quem nunca deveria ter saído da minha vida. Encontrei. Tentei apagar do pensamento a felicidade que me transmitia a sua presença, o seu toque e o seu sorriso. Continuei a viver o quotidiano como sempre fazia e não mudando em nada o meu rumo. O meu destino é este.
Destino é algo que não vejo a bons olhos. É o caminho mais curto para se viver a vida. Mas é algo que uniu o que eu tentei sempre afastar.
É impossível esquecer quem tanto bem costuma fazer mas tanto mal traz. A felicidade que procuro está junto da pessoa que amo. Mas a infelicidade teima em me acompanhar pelo meu mundo à muito parado. Vejo nele a pessoa que não consigo odiar. Vejo em mim a pessoa que nunca conseguirei amar. Estar entre a espada e a parede não é a mesma coisa do que ser a infelicidade a lutar contra si própria.
Do toque gelado, o meu coração acordou. Viu quem eu era afinal e o que pretendia na altura. E agora, sei o que quero mas sei também que o impossível é também o incansável pedido de acção. Mas eu não posso agir perante algo tão difícil na minha mente. As hipóteses de alcançar algo impossível transformam a minha felicidade em angustia. Mesmo sabendo que mudaria o meu mundo para fazer alguém feliz. Mesmo sabendo que daria o que fosse preciso para alcançar um sorriso. Sou o ser pequeno que num grande corpo se esconde.
Todas as acções que parecem tão banais, para mim são tão radicais. E é das conversas parvas que revelo sentimentos verdadeiros. Mas as minhas grandes revelações estão escondidas no meu silêncio.

Agora que abri os olhos para olhar em frente apercebi-me que a coisa que mais queria era poder viver duas vidas: a minha e a nossa.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Anorexia


Beleza. Moda. Amigos. Valor. Confiança. Orgulho... Tudo um caminho para um beco sem saída.
Sei que inúmeras raparigas no mundo sofrem de anorexia. Sei também que muitas delas não admitem e não vêem o mal que fazem a si próprias. Vêem a elegância como ela não existiu e a gordura onde já não existe. Sei também que há raparigas que invejam o meu corpo, tanto pela minha altura como pela minha condição física. O que elas não sabem é o que vai por dentro.
Escrevo a mensagem que quero passar a todas as raparigas que vivem obcecadas pela elegância e pela beleza. Vou aqui contar a minha experiência de vida de uma maneira simples e fácil de perceber.
Eu era uma rapariga bem constituída. Apesar de não ser obesa nem aproximar-me de tal extremo, era uma rapariga gorda. Vivi a minha infância sem preocupações. Tudo na infância era um mar de rosas e o futuro algo muito fácil. Comia bem para a minha idade e não tinha problemas nenhuns em comer.
O meu pai um dia proibiu a minha mãe de comprar doces para casa para evitar que eu engordasse mais. Eu era gozada pelo meu irmão e pelo meu pai que me chamavam de ''miss pigy'', ''baleia'', ''gorda'', etc. Entrei para a a escola básica (do 5º ao 9º ano) e sentia-me frustrada. Sentia-me posta de parte, sentia-me mal comigo mesma e via que todas as raparigas bonitas eram magras. Com medo de ser gozada também na escola e na esperança de encontrar confiança em mim mesma, deixei de comer. Guardava o dinheiro do lanche e almoço para depois comprar jogos para a PlayStation. Comecei a emagrecer e a crescer muito depressa. Nessa altura, até já magra, via-me gorda. Via no espelho uma rapariga ridícula e feia. Alguém que não queria ser. Continuei a emagrecer e a ter problemas em fazer educação física. Sentia tonturas e cansava-me muito depressa. Sono também me dava muitas vezes mas eu nunca liguei.
Nas férias de verão de transição do oitavo para o nono ano, comecei a dormir até tarde. Comecei a não almoçar nem lanchar. Apenas jantava. Isto durante alguns tempos até ficar-me com apenas um prato de sopa por dia. Ai comecei a reparar nas minhas mãos. Os ossos e as veias salientes metia-me nojo. Os ossos do peito e costelas vincavam a pele clara. Quando reparei em tudo isto, já era um pouco tarde de mais. Tudo o que eu comia fazia força para sair. Ficava mal disposta depois de comer qualquer coisa.
Começou a escola e a minha directora de turma veio falar comigo assustada com a minha aparência. Ela tinha sido minha professora no oitavo ano e tinha ficado assustada com as diferenças que haviam no meu corpo. Ela tentou ajudar-me oferecendo-me senhas da cantina gratuitamente durante cerca de duas semanas. Tudo para ver se eu comia.
Sempre que ia a um médico, receitavam-me vitaminas. O meu dentista, alertava-me dos riscos que sofria ao estar naquele estado e também ele receitava-me vitaminas.
Com a rotina da escola e amigas a ajudarem-me, conseguia recuperar um pouco todos os dias. Foi difícil sair daquele caminho. Foi difícil voltar a comer mas teve de ser.
Agora aviso a todas as raparigas: a minha história não acabou aqui. Eu por vezes tenho recaídas e deixo de ter apetite e vontade de comer. Emagreço de mais e fico perto de voltar aquilo que fui.
Estou a recuperar de outra recaída e sinto-me fraca. E a coisa que mais me custa é ouvir os comentários que fazem e a maneira como gozam. Agora eu estou assim porque o corpo pede. Eu não chamo isto elegância e peço a todas as raparigas para não terem inveja do meu corpo. Além de corpo justo aos ossos, também tenho muitas quebras de tensão, queda de cabelo, unhas frágeis e maior probabilidade de apanhar doenças.

Não façam disto um caminho para a obrigação do vosso próprio corpo. Não precisam de ser magras para serem belas. A maior beleza está no interior e não no exterior.

Hoje em dia, a coisa que mais odeio é ouvir raparigas lindas e elegantes a dizerem: ''Estou gorda. Preciso de uma dieta''.

Eu não como por prazer apesar de querer. Eu como para sobreviver.